quarta-feira, setembro 22, 2010

No chão.

Lá se vai, quase desfalecendo
Bem calmamente, parece não agüentar mais
Vai suspirando, clamando e morrendo
Até que, cansado, no chão ele cai

Queda difícil, machuca os joelhos,
Traz traumas, vergonha e até desespero
É triste o momento e a visão é tão feia
Daquele cuja fé não é nem centelha

E então, já não importam os insensíveis
Quando ele próprio nada sente,
E já nem faz questão de se preocupar
Pela indiferença, ele disfarça e mente

Não há vontade, nenhum fervor
Abriu-se um rombo no mundo
É como ser estrangeiro, sem teto e dinheiro
É a vida sem rumo de um falido herdeiro

“Cadê o argumento, a causa, a razão?
Quem deu o direito de me jogarem no chão?
Me deixem chorar, me deixem entender
Esse descaso, esse abuso “cristão”!”

No jogo da fé e da religião
Murcharam a bola do bom campeão,
Bateram sem punho, com boa intenção
Explicaram a dor com um velho jargão

Deus, tu és Santo, visita teu filho,
Retira-o da poça da humilhação
Relembra tua obra, o auxílio divino,
Respira em sua face, o faz levitar...

É mágica tua mão de socorro, ele sabe
É sincero teu bem querer, ele crê
Dá-lhe tua chancela, levanta o pobre caído
O santo remido que Teu Espírito vê
Ele é teu filho e te espera ansioso
No buraco barroso que o fez se perder...

Deus, tu és Santo, visita teu filho,
Retira-o da poça da humilhação
Relembra tua obra, o auxílio divino,
Respira em sua face, o faz levitar...
Ele é teu filho e te espera ansioso;
Sabe que só o Pai amoroso
O pode encontrar.

quarta-feira, setembro 08, 2010

A Santa Perseguição.

Como dizer de maneira diferente aquilo que já foi dito? Como reafirmar o que já foi diversamente registrado? Eu não sei. Mas às vezes surge essa vontade de dizer novamente o que já se sabe há muito tempo. Deus me persegue. Ele não me acompanha nem me acha. Ele me persegue, gruda mesmo, não me larga, não se afasta. Estranho demais isso. É estranho pensar no divino tão próximo, tão íntimo e tão leal. Eu não sei bem como funciona esse amor do Criador pelo ser criado, mas penso que as criaturas aqui não poderiam inventá-lo do nada, tirar esse amor da cartola... A quem pensa que o homem criou Deus, meu parecer: o homem não é tão humano assim! Só mesmo a matriz do ser humano, o seu projetista, poderia e pode nos fazer recordar, relembrar nossa profunda condição de carência, de gente que chora e sofre de solidão. Só mesmo um Ser tão maior que nós poderia ser mais humanos do que nós conseguimos. Tudo isso é estranho, mas inegável.

O fenômeno da graça, esse privilégio dado a quem nunca teria cacife pra receber, faz com que o divino e o humano, o poder e a fraqueza não somente se encontrem e convivam, mas se fundam! É complicado pra nossa razão fantasticamente limitada admitir a realidade de uma nova natureza, nascida de um encontro eterno. Deus e homem são reconciliados e redimidos na cruz. Sim, porque Deus não falhou nem se conformou à rejeição humana. Deus não presumiu que ser divino era o bastante. Deus não se garantiu em seu status quo porque desde sempre a sua mente era a mente do “adorado e amado”. Outra coisa estranha, mesmo que óbvia: Deus de verdade é Deus amado e não somente enaltecido. Deus de verdade é aquele único que consegue ser amado, desejado, querido e buscado com todo o coração, alma e entendimento. Ora, esses tantos deuses-ídolos alvos de bajulação interesseira parecem mais escandalosamente inferiores, baixos, vulgares... O Santo que é Justo é também um Deus de amor e afagos.

É esse Deus que me cerca por trás, por diante e põe a mão sobre mim. Pensar nessa cena deveria provocar uma revolução em nossa maneira de viver. Deveria nos gerar uma confiança inequívoca de que não há solidão com Deus porque não somos mais aquilo que éramos. Nascemos de novo, temos sua companhia nas entranhas, os poros, no coração, na mente, no corpo, em todos os lugares... Em todas as locações, ambientes e circunstâncias. É Deus que não deixa o homem. Esquisito; nada usual. Mas uma verdade. Verdade porque ele não enxerga a escuridão que nos cerca, atemoriza, envergonha. O Deus da luz enxerga tudo e nos alcança através de tudo, não importa quão espessa seja a camada de trevas... Bobagem, Ele não pede licença, passa e caminha por onde quer pra fazer o que tem em mente. É um Deus incontrolável. Alguém que não se restringe nem se acanha ou melindra com nada. Nem com o mal que me cerca e sufoca, nem com a dor que me cega... Nada é barreira, nada nos separa, não há mais véu.

Sim, como o salmista desabafa: tal conhecimento é grandioso demais para o ser criado, que mesmo tendo muito a criar, permanece criado, restrito, limitado e absurdamente frágil. E como explicar esse valor que Ele, o Senhor Todo-Poderoso, aplica a nós a ponto de tanto desejar o nosso amor, de tanto querer nos dar do seu amor, sendo adorado ou não?! Mas que maravilha de amor! Que maravilha de Deus veio viver em mim!

quarta-feira, setembro 01, 2010

Até hoje, o que você fez?


Há poucos anos atrás, tirei um tempo para conversar com um grande amigo – desses raros, que sabem ouvir com a alma e verdadeiro interesse pelo que está além das palavras - e ele, em sua doce empatia, compartilhou comigo uma lição que lhe ensinaram a respeito do amor. Ele dizia que uma vez se interessou por uma mulher e foi conversar com ela a respeito de seu sentimento. Disse a ela que gostava muito dela, que a via como uma pessoa realmente especial. Qual não foi sua surpresa ao receber a resposta sincera da moça: “Ok, é muito bom saber que você me considera e tem esses sentimentos por mim, querido. Mas eu preciso te fazer algumas perguntas bem sérias: Até hoje, o que você fez em relação a mim a fim de demonstrá-los? De que forma você age para fazer com que eu realmente me sinta especial pra você? Lamento ter de dizer isso, mas até hoje você não fez absolutamente nada neste sentido e, infelizmente, seu interesse por mim não é o bastante pra mim. Com toda a franqueza, não me lembro do nome nem faço idéia de quem é a tal mulher que lhe disse isso, mas tenho absoluta certeza de que suas palavras tocaram o caráter daquele rapaz e vieram ao encontro de tudo aquilo que eu sentia naquela ocasião e, por isso, jamais esquecerei desse princípio.

Eu sempre entendi o amor dessa forma em que ela resumiu. O amor precisa ser factível, quase palpável. Além disso, ele precisa ser exeqüível... Qualquer coisa menor que isso deve ser considerada como sentimentalismos infantis ou qualquer outra ilusão cretina. O amor platônico, do mundo das idéias e das hipóteses, não é nem de longe parecido com algo digno e dignificante. Ele confere cargas e injustiças para os dois lados e se alimenta da mentira diabólica. Ele é o mal camuflado de bem, pois é egoísta e manipulador. É o interesse utilitário, frívolo e absolutamente leviano, que se expressa bem em palavras e atitudes menores, fáceis e aleatórias. É inconstante porque, de tanto sonhar, foge da urgência real e nunca está presente quando poderia ser necessário e até útil. De fato, nunca será útil, uma vez que é inconveniente e ensimesmado. Como seria bom se mais homens e mulheres acordassem para a honestidade de seus sentimentos errados. Haveria mais espaço para o verdadeiro amor nascer se grande parte das pessoas não se contentasse com tão pouco e não se rendesse ao que não importa. Mas para muitos, ainda é preferível fingir pra agüentar o tranco. Fingir que ama e fingir ser amado. Há quem prefira viver mal-amado e mal-amando contanto que não se precise provar nada; contanto que não precise abrir mão de nada. Quão infeliz é esse “amor” que limita!

E, pra variar, minha memória trabalha em torno das palavras de Cristo, aquele que soube amar até o final e desde sempre... Aquele que não se deixou impressionar pelas performances humanas e nem agiu antes de sentir. Lembro que Jesus comprovou a qualidade do que sentia por nós sem a tagarelice dos discursos óbvios e convenientes e sem a vaidade típica de quem ama muito menos do que deseja fazer crer. Em contrapartida, foi ele mesmo que exigiu a prova, mostrando que o amor que estava disposto a receber deveria passar pelo crivo da coerência e da transformação do caráter. “Pedro, você me ama? Então faça aquilo que eu faria”. “Pedro, você me ama? Prioriza o que toca a minha alma”. “Pedro, você me ama mesmo? Tome as minhas dores pra você!” “Pedro, você me ama? Transplante o meu coração para o seu peito, sinta o que eu sinto, seja um comigo!” O verdadeiro amor nos evolui.

Quem entende a verdade do amor não pode mais viver e agir da mesma forma, negando ao ser amado o devido resultado de quem se doa. Quem decide viver o amor de Deus não é capaz mais de fingir ao outro que ama errado. Quem assume o amor, assume a conta, seu bônus e ônus. Quem ama de verdade faz da vida do ser amado a sua própria e já não aceita mais que ele morra por causa de sua omissão.

Louvo ao Pai amoroso por ter amigos que me ensinam a amar. E fico extasiada em pensar que o amor de seu filho me dá o direito de viver além do que eu seria capaz se me rendesse à camuflagem dos amores falsificados, encharcados da perversidade do orgulho e do medo. Sempre guardarei em minha consciência o quanto é belo e profundo o amor que dá continuidade à vida de quem até mesmo já morreu... Porque o verdadeiro amor nos prova... E nos joga na vida.